A religião para Freud
Sigmund era ateu, porem propôs-se
a estudar a espiritualidade, tomou como objeto de estudo o cristianismo. Em
1927, Freud escreveu um texto um tanto violento dirigido à religião - talvez
refletindo no papel o desamparo absoluto que sentia, dado que à altura seu
câncer já se encontrava em fase avançada. Retomando o entendimento do
sentimento religioso como uma neurose universal - ideia inicialmente discutida
em um artigo de 1907, "Os atos obsessivos e práticas religiosas",
Freud, em "O futuro de uma ilusão", procura responder por que os
homens, insistem em depositar sua fé em algo tão etéreo quanto a religião.
Ele inicia sua análise
apontando o fracasso do processo civilizatório: não há uma distribuição igual
das riquezas materiais; as leis não garantem a proteção contra a violência da
humanidade; e, por mais que controlemos a natureza, somos completamente
passivos às imprevisibilidades. Freud dirá que ao passo que os dois primeiros fatores
se dão na esfera individual – com a vontade que cada indivíduo tem de mudar a
sociedade; o último se dá na esfera da sociedade como um todo - afinal, a
natureza aflige a todos por igual e o controle dela sempre se deu na esfera
social.
O ser-humano, animal
insignificante, está entregue ao revés da natureza, com seus terremotos,
furacões e tempestades, e nada pode fazer de prático quanto a isso. Assim,
teorizará Freud, o homem, para dar conta dos fenômenos sobre os quais não é
capaz de exercer controle algum, humaniza-os. É assim que surgem os deuses -
como respostas práticas e simbólicas diante do imprevisível - e eles, quase que
por displicência, surgem enquanto pais: os criadores da humanidade, e, assim,
seus possíveis destrutores. É assim que surge a religião.
Freud nos dirá, sobre as
ideias religiosas, que essas consistem em afirmações sobre fatos e condições da
realidade que nos dizem algo que não descobrimos por nós mesmos e reivindicam
nossa crença. Assim, são análogas aos ensinamentos escolares - ainda que os
últimos tenham alguns argumentos a seu favor: todo conhecimento escolar,
adquirido pela ciência, é suscetível a provas, ao passo que o mesmo não se pode
dizer da religião.
Contudo, os ensinamentos
merecem ser acreditados porque já o eram por nossos primitivos antepassados; em
segundo, possuímos provas que nos foram transmitidas desde os tempos primevos;
em terceiro é totalmente proibido levantar a questão de sua autenticidade.
Freud critica os três:
quanto ao primeiro, aponta que, já que nossos antepassados eram tão menos
inteligentes que nós, nada ganhamos em acreditar neles; rebate o segundo
apontando que tais provas são usualmente falsificadas e cheias de contradições;
e a terceira, ela mesma, aponta uma séria fraqueza da religião - afinal, se o
questionamento de alguma ideia é punido com a tortura ou a morte, é sinal de
que essa ideia não se sustenta tão bem por si só. Se, das ideias mais
valorizadas pela humanidade, a religião é ao mesmo tempo a mais sólida e menos
bem fundamentada, o que faz com que tal contradição aconteça? Para Freud, isso
se deve a um problema psicológico - mais especificamente, um desejo psicológico
da humanidade. A religião, dirá Freud, encontra sua força no fato de que ela
fornece um pai, solucionando o desamparo humano; uma ordem moral mundial que
assegura a justiça entre os homens; e a vida eterna, solucionando o problema da
morte - ou seja, a religião fornece uma resposta aos desejos mais antigos da
sociedade. É, assim, uma ilusão.
Então, ele pôs-se a
criticar severamente a persistência da religião na sociedade. Aponta que, se a
religião não é efetiva em tornar o homem mais feliz, não há necessidade de um
deus. Assim, afirma que a queda da religião é mera questão de tempo, e, nesse
sentido, preocupa-se que, caso as ideias religiosas caiam e nada venha em seu
lugar, a sociedade entre em rebelião e desrespeite as regras que ela própria criou.
Freud associa aqui a religião à neurose obsessiva infantil, apontando que se as
crianças, no processo civilizatório, têm que passar por uma fase neurótica, ao
passo que a humanidade teve que passar pela religião para obter o mesmo
intento. Se essa relação é correta, as ideias religiosas fatalmente se
dissiparão no processo de crescimento, como deve ocorrer com todo ser humano.
Assim, o que Freud propõe é que dispensemos as explicações religiosas aos
fenômenos da vida cotidiana. Além de tirar o caráter ilusório do pacto social -
o que estaria destinado a esfacelar-se -, abandonar a explicação religiosa
possibilitaria um sistema de leis baseado em regras históricas, sociais e,
assim, mutáveis.
fonte: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-48382016000100008
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